Qual fator é o mais significativo? Genética vs Ambiente

Desde os primórdios da discussão no mundo científico sobre qual o fator que tem mais influência no comportamento humano entre a genética e o ambiente, houve muitos estudos, muitas hipóteses e teorias, experiências foram realizadas, mas faltou sempre algo, um consenso geral. De facto, este tópico é aberto a muitas perspetivas e teorias, e também pode ser tido em conta em muitas áreas de atuação e rendimento humano.
Contudo, mesmo com a falta de uma opinião sólida e unanime no mundo cientifico, há um aspeto que toda a gente tem em consideração, ambos os fatores, genéticos e ambientais, contribuem, em diferentes preponderâncias para o desempenho de um ser humano em qualquer área, não havendo apenas influências de fatores genéticos, ou ambientais, mas sim uma complementação destes.
No mundo desportivo, é imperativo a existência de muito trabalho, dedicação e esforço para atingir o topo da performance desportiva nas diferentes modalidades existentes, porém também só se tornam realmente atletas de elite e estrelas do desporto aqueles que possuam um conjunto de fatores genéticos favoráveis à sua modalidade, como por exemplo, dificilmente um jogador de basquetebol de topo a nível mundial terá 1,70m de altura, já que não possui as características genéticas necessárias para ser um atleta competitivo contra os atletas com 2m de altura, sendo um entrave à performance desportiva.
E nada melhor para discutir e refletir sobre este tópico do atletas e ex-atletas profissionais que competem, ou competiram ao mais alto nível mundial, que mais que ninguém conhecem as realidades das competições desportivas ao nível internacional. Para isso tivemos a colaboração do ex-ciclista profissional Tiago Machado, e do remador André Pinto!
Entrevista Tiago Machado
Comecemos pelo ex-ciclista profissional Tiago Machado, com várias participações em todas as Grandes Voltas e com vitórias como a Volta da Eslovénia e vários Campeonatos Nacionais de Fundo e CRI, um marco no ciclismo português e rotulado como um dos melhores ciclistas portugueses de sempre. Fica agora o seu testemunho sobre a matéria.
Pergunta: Ao longo da tua carreira consideras que já tinhas um talento natural para o ciclismo, ou que tudo o que alcançaste foi fruto do teu esforço, trabalho e dedicação, ou, até um pouco dos dois?
Tiago: Na minha opinião foi fruto das duas coisas, uma complementa a outra, sem a genética a ajudar por muita dedicação e esforço que tivesse não ia ser suficiente.
Pergunta: Consideras que alguns dos teus adversários não trabalhavam tão arduamente e mesmo assim conseguiam bons resultados? Se sim, quem?
Tiago: Não acho isso, no ciclismo se não trabalhas arduamente pagas isso na estrada, mais cedo ou mais tarde!
Pergunta: Achas que as jovens promessas do ciclismo hoje em dia são fruto do talento natural, ou do seu trabalho e dedicação?
Tiago: De tudo. Tem talento muita dedicação e muitas mais condições de trabalho do que havia na minha geração e nas gerações anteriores.
Pergunta: Em comparação com as outras modalidades, achas que o ciclismo está mais dependente dos fatores genéticos, do talento natural, para atingir o topo?
Tiago: Sim, temos de ter uma boa genética para singrar no ciclismo.
Obrigado pela tua colaboração Tiago!
Entrevista André Pinto
Passamos agora para o atleta André Pinto para nos responder a algumas questões sobre o tema. O André é atualmente um dos mais destacados remadores do país. Tem 22 anos e compete pelo Viana Remadores do Lima e pela nossa seleção. É bicampeão do mundo de remo indoor e em breve tentará o apuramento para os JO de Paris 2024.
Pergunta: Ao longo da tua carreira consideras que já tinhas um talento natural para o remo, ou que tudo o que alcançaste foi fruto do teu esforço, trabalho e dedicação, ou, até um pouco dos dois?
André: No início talvez achasse que sim, que teria um talento natural, mas rapidamente ao chegar aos escalões de competição comecei a ser ultrapassado por atletas com menos "talento" e que sem duvida muito mais esforçados, o que me levou a crer que talvez com o talento não fosse tão longe. Hoje considero que seja um misto dos dois envolvido.
Pergunta: Consideras que alguns dos teus adversários não trabalham tão arduamente e mesmo assim conseguem bons resultados? Se sim, quem?
André: Não, acho que todos trabalhamos muito a volta do mesmo, tanto em volume como intensidade, e os que não o fazem rapidamente caem na tabela.
Pergunta: Achas que as jovens promessas do remo, hoje em dia, são fruto do talento natural, ou do seu trabalho e dedicação?
André: Misto dos dois, porque infelizmente sem o talento inicial , não existe uma aposta nesses atletas e leva a que acabem por nem existir por nunca chegarem a fase de se esforçarem mais.
Pergunta: Em comparação com as outras modalidades, achas que o remo está mais dependente dos fatores genéticos, do talento natural, para atingir o topo?
André: Sim. Embora ache que com o esforço se consiga chegar muito longe, ao topo, apenas com muito talento natural e muito esforço.
Obrigado pela tua ajuda André!
Com estes dois testemunhos verificamos que no desporto profissional, além de todo o trabalho, dedicação e esforço, é necessário ter predisposição genética, pois esta assume um papel importante no nível de competitividade que o atleta poderá alcançar, ou seja, só através de um bom equilíbrio entre fatores genéticos e ambientais é que é possível se demarcar no mundo da elite desportiva.
Também é importante realçar que nos escalões de formação muitas vezes, quando se olham às jovens promessas, cujas têm uma boa base genética para determinada modalidade, podemos estar a desconsiderar atletas que podem também alcançar a elite com trabalho árduo e que muitas vezes efetivamente são os que mais trabalham em relação aqueles com a melhor predisposição genética e que acabam por realmente serem esses a singrar no desporto, já que muitas vezes aqueles com o talento natural descoram do trabalho por acharem que não precisam, que como sabemos não é verdade, ou seja, a seleção de talentos nos escalões de formação não se deve observar pela obtenção de resultados no imediato mas com uma perspectiva de evolução futura!
Referências bibliográficas:
- Barry Kaufman, S. (2019, January 18). There Is No Nature–Nurture War [Review of There Is No Nature–Nurture War]. Scientific American. https://www.scientificamerican.com/blog/beautiful-minds/there-is-no-nature-nurture-war/